quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Manhas de polvo

São inteligentes e criativos
Terem três e sangue azul não é a sua característica mais extravagante. Estes moluscos fascinam a ciência pela sua grande inteligência, o comportamento complexo, os dotes que revelam no momento da conquista e o dom para se orientarem.
Sem arroz – A imagem mostra um polvo gigante, Enteroctopus dolfleini. Vive no Oceano Pacífico e alcança os nove metros de comprimento.
Bípedes quando precisam
Em 2008, 24 centros oceanográficos europeus iniciaram um estudo para descobrir se os polvos eram octodestros e se serviam dos oito tentáculos com a mesma destreza, ou se, pelo contrário, recorriam a um em particular. O que observaram foi que eles utilizam duas das extremidades para se deslocarem sobre o leito marinho e as outras seis para explorarem e investigarem os objectos ao seu alcance, incluindo peças de lego e cubos de Rubik que os biólogos lhes ofereciam nas suas experiências. Confirmou-se, assim, o que já tinha sido observado, em 2005, na Indonésia, por biólogos da Universidade da Califórnia: quando um polvo precisa de fugir, levanta seis braços e utiliza os outros dois para correr a toda a velocidade pelo fundo do mar.
Sexo com amor e abraços
Durante décadas, os cientistas viram os octopódes como seres solitários e nada românticos na sua vida sexual. Todavia, um estudo recente da Universidade da Califórnia revela que os machos não acasalam com a primeira fêmea que se atravessa no caminho. De facto, costumam rondar durante vários dias a candidata eleita, adornam-se com padrões vistosos na pele, mantêm os rivais á distância e abraçam mesmo, carinhosamente, algum braço da companheira depois de a terem conseguido conquistar.
Esperto que nem um alho
A fim de medir a inteligência dos polvos, os zoólogos recorrem a testes nos quais avaliam, sobretudo, dois parâmetros: a capacidade de aprendizagem e a memória. Deste modo, descobriram que eles se entendem a distinguir formas geométricas (quadrados, retângulos, circulos…), abrir boiões com tampas de enroscar ou atravessar complicados labirintos. Além disso, os cefalópodes aprendem ao observar os seus semelhantes, um comportamento que se considerava exclusivo do ser humano e de alguns mamíferos. Como demonstrou uma experiência o neurobiólogo Benny Hochner, possuem um circuito de memória a curto prazo e outro a longo prazo. Não é por acaso que os polvos possuem meio milhão de neurónios organizados numa complexa rede de lóbulos, semelhantes á estrutura do cérebro humano.
Um lado venenoso
Há três anos, a revista Jornal of Molecular Evolution fez eco de um estudo da Universidade de Melbourne (Austrália) que demonstrava que todas as espécies de polvo (e de chocos e de lulas) têm alguma substância tóxica no organismo para se defenderem dos predadores ou atacarem as presas. Ao analisar os genes que produzem as diferentes peçonhas que esgrimem, os biólogos concluíram que a origem do arsenal remonta a um antepassado venenoso comum aos polvos, aos chocos e às lulas.
Imitadores natos
Quando há um predador nas proximidades, o polvo-mímico (Thaumoctopus mimicos), da Indonésia, pode mascarar-se de raia venenosa, serpente marinha, peixe-leão cheio de espinhos ou mesmo alforreca. Todods os papéis de mau assentam bem a este octópode. Já no Atlântico, destaca-se como o ator o polvo Macrotriopus defilippi, de tentáculos compridos, que se oculta dos inimigos copiando a forma e os movimentos da solha, um peixe chato semelhante ao linguado.
Muita personalidade
A psicóloga Jennifer Mather e o biólogo Roland Anderson iniciaram, em 1993, um trabalho pioneiro com mais de 40 polvos vermelhos, para averiguar se os seus comportamentos podiam ser individualizados. Depois de os exporem a situações distintas em semanas diferentes, concluiram que se podia enquadrar, nitidamente, o seu comportamento em três tipos de personalidade, aplicados, até então, apenas a seres humanos: agressivos, tímidos e passivos. Os resultados foram publicados no Journal of Comparative Psychology.
Passar despercebidos
A epiderme dos polvos contem células com pigmentos, os cromatóforos, que lhe permitem mudar de cor e de padrão decorativo (pele lisa, com riscas, manchas…) com extrema facilidade. Assim, podem camuflar-se e passar despercebidos tanto entre recifes de corais vermelhos como sobre a areia cinzenta. As mudanças de tonalidade também lhes servem para exprimir a sua disposição.
Arsenal defensivo próprio
Em 2009, o polvo Amphioctopus marginatus, da Indonésia, juntou-se á lista de animais capazes de usar ferramentas. Tal como mostrou uma investigação publicada na revista Current Biology, os exemplares desta espécie recolhem as cascas de coco que caem no fundo do mar e armazenam-nas num local escondido, para serem usadas como escudo defensivo. Veja-os neste vídeo: http://www.youtube.com/watch?v=QRfOGOntnbw
GPS incorporado
Embora estes animais passem horas a caçar e percorram centenas de metros nas suas explorações, costumam regressar todos os dias á toca para descansar e nunca se esquecem do caminho de regresso. O segredo para não se perderem no fundo do mar? Ao estudar o polvo vulgar (Octopus vulgaris), nas Bermudas, a psicóloga Jennifer Mather, da Universidade de Lethbridge (Canadá), chegou á conclusão de que eles não deixam um rasto químico á sua passagem, como as formigas, mas visualizam as rochas proeminentes, plantas, corais e outros aspetos que encontram ao longo da rota, para traçarem um mapa mental que conservam no cérebro durante semanas. A sua memória espacial é extraordinária.

Super interessante nº168 – Abril de 2012

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