sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Norte-americana FDA prestes a aprovar comercialização de salmão transgénico


Peixe produzido pela Aquabounty cresce duas vezes mais rápido do que o normal

2012-12-26
Salmão trangénico e não trangénico com a mesma idade (créditos: AquaBounty)
Salmão trangénico e não trangénico com a mesma idade (créditos: AquaBounty)
A agência Food and Drug Administration (FDA), que regula e supervisiona a segurança alimentar e os medicamentos, afirmou que os salmões transgénicos, estão a ser produzidos pela empresa Aquabounty, é seguro como alimento e não causará grande impacto ambiental, abrindo assim a porta à aprovação do primeiro animal geneticamente modificado para consumo humano.
O salmão transgénico cresce duas vezes mais rápido do que o normal e os seus críticos já o baptizaram como “frankenpeixe” (alusão ao monstro de Frankenstein). Estes temem que o peixe possa causar alergias ou até dizimar a população natural de salmões se a variedade transgénica procriar na natureza. A FDA fará ainda uma consulta pública sobre o tema, mas especialistas acreditam que estas declaração foram o último passo antes da aprovação.
A empresa Aquabounty gastou mais de 67 milhões de dólares (aproximadamente 50 milhões de euros) para desenvolver este peixe, tendo igualmente desenvolvido medidas de protecção contra problemas ambientais. Uma delas é a criação de apenas fêmeas estéreis, ainda que uma pequena percentagem possa reproduzir-se, admitem.
Este salmão transgénico recebeu um gene da hormona de crescimento do salmão do Pacífico, que se mantém funcional o ano inteiro devido a outro gene de um peixe similar à enguia. A combinação permite que o salmão chegue ao peso ideal para venda em 18 meses em vez de três anos.
Ainda não se sabe se o público aprovará o peixe, mesmo dando a FDA o seu aval. Se o salmão entrar no mercado, os consumidores podem nem chegar a saber que estão a comprar peixe transgénico, já que o produto não será acompanhado de qualquer aviso, caso seja decido que possui as mesmas propriedades do convencional.
Fonte: Ciência hoje

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Estrela-do-mar


Descubra a anatomia destes animais marinhos carnívoros, pertencentes ao grupo dos equinodermes.
Braços – A maioria tem pelo menos cinco, mas algumas podem chegar aos 40. Se um braço for ferido ou amputado, nasce um novo – a regeneração pode demorar pelo menos um ano.
Madrepórito – Um orifício na parte de trás do corpo permite a entrada de água.
Ânus – A maioria da comida não digerida é regurgitada, mas os eventuais restos são expelidos pelo ânus.
Canal anelar – A água do mar que entra no corpo, pelo madrepórito, é filtrada e espalha-se do canal anelar para o radial, antes de passar para os pés ambulacrários. 
Gónada – Aqui são produzidas as células sexuais (óvulos e espermatozóides). Os gâmetas são depois libertados na água para fertilização, através de um orifício na parte de trás da estrela-do-mar.
Ampola – A estrela-do-mar não tem sangue; o que flui pelos seus braços é água do mar filtrada. Quando a ampola se contrai, a água é encaminhada para os pés ambulacrários, dilatando-os. Quando a ampola se dilata, os pés retraem-se, permitindo que a estrela-do-mar se desloque e se fixe.
Pele – A estrela-do-mar não tem cabeça nem cérebro; em vez disso, usa células dérmicas sensitivas para detectar cheiros e químicos de alimentos, e manchas ocelares na ponta de cada braço para detectar luz. Estas células impressionantes enviam sinais através de um sistema nervoso.
Pés ambulacrários – Um sistema interno de minúsculos tubos flexíveis prolonga-se para o exterior do corpo. Na ponta de cada tubo há uma ventosa, conhecida como pé ambulacrário, que a estrela-do-mar usa para trepar rochas e se endireitar quando fica ao contrário. Por serem tantos, estes pés são muito poderosos e até ajudam o animal a abrir conchas.
Estômago – Algumas estrelas-do-mar têm ventosas nos braços, que lhes permitem abrir conchas de amêijoas e outros invertebrados. Depois, empurram as membranas flexíveis do seu estômago, através da boca, para dentro da concha. Enzimas digestivas são segregadas, permitindo a absorção do alimento. As que não possuem ventosas, engolem as presas inteiras e cospem o que não conseguem ingerir.
Ceco/ducto pilórico – Aqui são produzidos os sucos digestivos e armazenada a comida digerida.
Fonte: quero saber Novembro 2010

domingo, 16 de dezembro de 2012

Extremófilos- E o campeão é…


Os microscópicos tardígrados são os seres mais adaptáveis
O título de campeão da resistência devia ser atribuído aos tardígrados, una diminutos invertebrados muito abundantes no nosso planeta. Até agora, já foram encontradas cerca de mil espécies, as quais ocupam regiões tão díspares como os Himalaias, as zonas equatoriais e árcticas ou os oceanos, onde chegam a viver a 4000 metros de profundidade. O tamanho de um exemplar adulto varia entre 1,5mm, nas formas maiores, e 0,1mm, nas mais pequenas. Embora sejam transparentes, podem apresentar diferentes tonalidades em função da sua alimentação, que inclui rotíferos, bactérias, nematodes e algas, cujos fluidos celulares conseguem absorver.
Os tardígrados têm especial predilecção pelos ambientes aquosos. Todavia, quando as condições ambientais se alteram e se tornam desfavoráveis, entram num estado latente designado por “cripto biose”: suspendem todas as funções metabólicas, enrolam-se e esperam que as coisas melhorem. Algumas espécies podem permanecer em estado desidratado, como se fossem múmias, durante quase uma década; para isso, sintetizam um açúcar não redutor denominado “trealose”, que protege as membranas celulares. Além disso, detêm os seguintes recordes entre os animais:
Calor e frio – podem sobreviver alguns minutos a 150°C. Toleram igualmente uma breve congelação a temperaturas de até -272°C, próxima do zero absoluto.
Radiação – Suportam elevadas doses de raios X e raios gama, fatais para outras formas de vida. Sobrevivem também no vácuo do espaço, sob a radiação solar, durante 10 dias, como provam dois projectos científicos levados a cabo, em Setembro de 2007, na sonda Foton-M3 da ESA, que voou a uma altitude entre 250 e 290 quilómetros. Tinham agora ida e volta marcada para Marte, na sonda russa Phobos-Grunt, que afinal não conseguiu abandonar a órbita terrestre.
Pressão – suportam até 1200 vezes a pressão atmosférica á superfície do mar.
Super 164 – Dezembro 2011

Numa floresta do Panamá, há 25 mil espécies de artrópodes


Trabalho inédito avaliou a biodiversidade numa dada área de floresta tropical à procura de escaravelhos, abelhas, formigas e outros artrópodes.
O escaravelho Megasoma elephas vive no solo, por baixo da folhagem, na floresta de San Lorenzo CORTESIA DE THOMAS MARTIN, JEAN-PHILIPPE SOBCZAK E HENDRIK DIETZ
Ao contrário dos mamíferos, dos répteis ou das aves, o número de espécies de artrópodes que vivem nas florestas tropicais é uma grande incógnita. Os biólogos diziam que eram muito mais do que as que existem nas florestas temperadas e têm sido feitas várias estimativas. Mas nunca, até agora, se tinha realizado uma amostragem intensiva numa floresta tropical das espécies deste grupo animal.
Um consórcio de cientistas foi para uma floresta de Panamá, à procura de artrópodes de todos o tipo. Recolheu em dois anos 129.494 exemplares de 6144 espécies diferentes e estimou que, nos 6000 hectares dessa floresta, existiam 25 mil artrópodes, segundo relatou a equipa nesta sexta-feira na revista Science.
O trabalho de campo, em 2003 e 2004, foi na floresta de San Lorenzo. Os 102 cientistas envolvidos no estudo, liderados por Yves Basset, coordenador da Iniciativa Artrópode do Instituto Smithsonian de Investigação Tropical do Panamá, passaram os oito anos seguintes a analisar os exemplares recolhidos e a catalogar as suas espécies. Esta informação serviu ainda para analisar a biodiversidade da floresta.
“Desenvolvemos vários tipos de métodos para recolher diferentes subtipos de artrópodes que poderíamos encontrar na floresta”, explicou Basset em declarações num podcast da Science. “Aplicámos estes métodos desde o solo até à parte superior das copas florestais.”
Ao todo, usaram 14 métodos diferentes em cada sítio de amostragem no Panamá. Puseram técnicos a subir às árvores, foram à procura de nichos ecológicos, utilizaram balões de ar para alcançar os estratos mais altos da copa das árvores. Tentaram apanhar borboletas, moscas, escaravelhos, abelhas, formigas, insectos herbívoros, carnívoros, parasitas. Repetiram esta amostragem em mais 12 locais, em várias épocas do ano para ter a certeza de que apanhavam as várias fases de metamorfose das espécies.
A equipa utilizou depois modelos de biodiversidade para extrapolar o número de espécies que existem naquela floresta. Estimaram que há ali 25 mil espécies de artrópodes. O número de espécies novas para a ciência ainda não foi revelado, mas, segundo a estimativa da equipa, em grupos como os dos escaravelhos as espécies novas podem chegar aos 60 a 70%.
A equipa concluiu ainda que cerca de 60% desta biodiversidade pode ser encontrada em apenas um quilómetro quadrado de floresta, o que facilita este tipo de investigação noutros locais do mundo. Além disso, há uma relação estreita entre o número de artrópodes e de outros grupos de seres vivos: por cada espécie de planta vascular, ave ou mamífero existe respectivamente 20, 83 e 312 espécies de artrópodes.
Estas relações ecológicas podem ajudar a determinar o número de espécies noutras florestas tropicais. “As 25 mil espécies estimadas indicam que há um grande número de genes de artrópodes. A tragédia é que estas florestas tropicais estão a desparecer muito rapidamente, por isso podemos perder todos estes genes antes de sabermos o que fazer com eles e se podem ser úteis à humanidade”, defende Yves Basset numa entrevista aos jornalistas proporcionada pela Science.
Fonte: Público.pt

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Extremófilos – Testar os limites


Inúmeras criaturas terrestres, por se sentirem mais seguras ou sem competição, escolheram os ambientes mais extremos do planeta para viver, das águas em ebulição ao gelo glacial.
Os seres humanos sentem predilecção por determinados ambientes naturais. Gordon Orians, um conhecido ecologista da Universidade de Washington, descreveu deste modo o cenário onde a maior parte das pessoas gostaria de construir uma casa: num lugar elevado, próximo de um lago ou do mar, rodeado por um terreno semelhante a um parque. Grande parte do nosso planeta não é assim tão idílico; apesar disso múltiplos organismos conseguem povoar meios bastante adversos, muito distantes do nosso conceito de bem-estar.
Situadas nas cristas oceânicas, a mais de 2 quilómetros de profundidade e perto de zonas vulcânicas activas, as chaminés hidrotermais constituem um dos mais estranhos ambientes marinhos. Emanam compostos tóxicos, como ácido sulfúrico, a temperaturas que rondam os 400 °C. Nestes sinistros locais, onde reina a obscuridade e a pressão poderia esmagar um elefante, mora um dos animais mais resistentes ao calor, o verme poliqueta Alvinella pompejana. No interior dos túneis próximos das chaminés que habita, a extremidade da sua cauda suporta até 80 °C. Entretanto, a cabeça, que sobressai do tubo que a abriga, encontra-se a 22 °C. O segredo para a espantosa artimanha poderá residir na miríade de bactérias que revestem a parte dorsal do verme, com as quais mantém uma simbiótica e transcendente união. Esses microorganismos sintetizam, aparentemente, proteínas que funcionam como isolador térmico.
Formigas oportunistas. Arma térmica. As formigas Cataglyphis bicolor esperam que as altas temperaturas deixem as presas fora de combate e depois atacam-nas. [foto]
Alguns enclaves da superfície terrestre podem revelar-se igualmente insuportáveis. O meio-dia no deserto do Sahara parece a antecâmara do inferno. A fauna procura resguardar-se, mas, frequentemente, o calor torna-se letal para muitos insectos que não conseguiram encontrar abrigo. É precisamente a oportunidade aguardada pelas formigas do género Cataglyphis, que enchem a despensa com os cadáveres espalhados pela areia. Algumas espécies como a C. bicolor e a C. bombycina, podem resistir a temperaturas superiores a 50 °C. Esta proeza torna-se possível porque as formigas, antes de deixarem o ninho, produzem uma elevada concentração de um tipo de proteínas que protegem o insecto do choque térmico e evitam que outros prótidos e as membranas celulares sejam afectados. Através deste sistema interno de antecipação, as Cataglyphis sobrevivem ao calor extremo durante um breve lapso de tempo. Além disso, nos seus trajectos, procuram que apenas 4 das 6 patas entrem em contacto com o chão.
Frescos. Os vermes de pompeia, que chegam a atingir 13cm de comprimento habitam estruturas submarinas banhadas de gases nocivos e a temperaturas de 80°C. [foto]
Porém, o nosso mundo é um lugar maioritariamente frio; mais de 80% dos habitantes encontram-se a menos de 5 °C. Abaixo dessa temperatura, as enzimas, os catalisadores biológicos que tornam possível toda a química da vida começam a trabalhar muito devagar, o que torna mais lentos os processos metabólicos. A situação é pior quando a temperatura desce aos 0 °C ou menos, isto é, quando a água começa a transformar-se em gelo. Dado que os seres vivos contêm uma grande quantidade do líquido no corpo, qualquer organismo que não esteja protegido corre o risco de congelar e morrer quando as temperaturas descem abaixo desse limite, pois a formação de gelo no interior dos tecidos altera profundamente o seu funcionamento e pode mesmo causar danos nas estruturas celulares. Só para radicais. A milhares de metros de profundidade, as fontes hidrotermais sustentam um ecossistema formado por bactérias, vermes, anémonas e crustáceos, que partilham um ambiente tóxico, sem luz e que chega a atingir uma enorme pressão. 
Nem vestígio de água
Apesar de tudo, há animais que conseguem habitar lugares ultragélidos; de facto, durante o Inverno, alguns congelam de forma controlada para evitar que a perda de água nas células seja excessiva quando se forma gelo em seu redor. Para isso, sintetizam elevados níveis de substâncias crioprotetoras: açúcares ou glicóis que controlam a diminuição da água celular. Durante o processo, os órgãos vitais não podem gelar: encontram-se protegidos por entes proteicos que impedem, fundamentalmente, o aparecimento de micro agulhas de gelo. Recorrem a esse mecanismo crioprotetor alguns répteis e anfíbios, como a rã-dos-bosques (Rana sylvatica), a pequena rã-arbórea-cinzenta (Hyla versicolor) e a tartaruga-pintada (Chrisemis picta), que conseguem sobreviver a uma temperatura de 3°C negativos nos gélidos invernos da américa do Norte.
Os insectos também são difíceis de roer e alguns suportam bem o frio. Por exemplo, a barata-alpina da Nova Zelândia (Celatoblatta quinquemaculata) pode mesmo aguentar temperaturas de -10°C, quando 75% do seu corpo se torna practicamente um bloco de gelo. O lepidóptero Gynaephora groenlandica, da ilha de Ellesmere, no Canadá, constitui um exemplo extremo dessa aptidão, pois passa 90% da sua existência como se fosse um frango congelado, a -70°C. Possui apenas um período de actividade no mês de Junho, pausa que aproveita para se alimentar.
Não há dúvida que a água é um dos recursos mais valiosos. A nossa civilização não poderia subsistir sem o elemento líquido e constitui, de igual modo, um bem inegociável para os restantes seres vivos. As células necessitam de água como meio tanto para as reacções químicas fundamentais como para manter intactas as suas membranas. O que acontece, porém, quando se torna escassa?
Em épocas de seca, a robusta rã-touro africana (Pyxicephalus adspersus), que chega a pesar dois quilos, opta por escavar um buraco e esperar por tempos melhores. [foto]
Ali permanece, em estado letárgico, até chegarem as chuvas, envolta numa substância mucilaginosa que segrega e a protege da desidratação. Uma táctica semelhante é adoptada pelo peixe pulmonado africano Protopterus dolloi, que se afunda no lodo durante o estio. Sobrevive encapsulado num molde de mucosidade desidratada e com o metabolismo 60 vezes mais lento.
Uma amêijoa invejável
Os organismos podem adaptar-se às condições mais extremas, mas nenhum escapa ao destino final, a morte. Porém, numa tentativa para adiar o inevitável, alguns animais exibem uma surpreendente longevidade. O matusalém mais idoso que se conhece é um humilde molusco denominado amêijoa-da-islândia, Árctica islandica. Um exemplar encontrado em águas próximas da costa setentrional do país que lhe dá nome ultrapassava os 400 anos. Os investigadores da Faculdade de Ciências Oceânicas da Universidade de Bangor (Reino Unido) que descobriram a amêijoa calcularam a sua idade com base nas linhas de crescimento das valvas, mais ou menos como um especialista em dendrocronologia faria com os anéis de uma árvore. Alguns estudos indicam que a sua quase imperceptível senescência se deve a uma complexa combinação de antioxidantes químicos que o metabolismo do molusco segrega. Nesta competição com a morte biológica, as bactérias parecem ser os organismos mais afortunados. Espécimes extraídos do permafrost próximo do rio siberiano Khomus-yuryakh mantinham-se vivos passados 500 mil anos, devido a um metabolismo híper-lento e a uma capacidade excepcional para reparar o seu ADN. Parece difícil de ultrapassar, mas no entanto, essa aptidão pode ser comparada com a do hidrozoário Turritopsis nutricola. Na etapa adulta solitária e sexualmente madura, esta alforreca pode reverter a um estado de pólipo colonial e reiniciar o seu ciclo vital. Ao fim de algum tempo desenvolve-se outra alforreca. Em teoria, consegue reproduzir o processo indefinidamente, o que a transforma em imortal, desde que não se atravesse no caminho de um predador nem seja vítima de doença. No outro lado da balança, encontramos organismos que têm uma existência muito breve e são obrigados a deixar descendência antes da sua iminente partida. É o caso de alguns insectos efemerópteros, que perduram poucos dias na fase adulta. Com efeito, não costumam viver mais de 48 horas, e a maior parte não possui elementos funcionais na boca, pois nem sequer terá necessidade de se alimentar. Dois dias de sobrevivência como adulto parece uma forma extrema de existência, mas é muito tempo quando se compara com a brevidade existencial da fêmea da mosca-de-maio, Dolania americana. A fêmea vive menos de 5 minutos e, nesse curto suspiro, tem de escolher um parceiro masculino, acasalar e por ovos, a fim de assegurar a futura prole. A vida é um conquistador incansável perante as condições ambientais mais adversas. Quando se trata de sobreviver, recorre a múltiplas e insólitas estratégias. Em certas ocasiões, diferentes organismos desenvolvem entre si sofisticadas relações simbióticas. Noutros casos, as criaturas dispõem de uma panóplia bioquímica no seu metabolismo que a ajuda a ultrapassar situações que seriam fatais para os seres humanos. Algumas chegam desafiar a morte com a sua dinâmica vital. Muitos organismos exibem inventos naturais que lhe permitem refrigerar-se ou aquecer-se, suportar pressões extremas e, no caso de certos microrganismos, enfrentar as radiações e o vácuo do espaço exterior. Contribuem todos para atribuir um significado mais vasto ao que é geralmente entendido por “ser vivo”.
Super 164 – Dezembro 2011

Nova espécie de primata descoberta na ilha do Bornéu


N. kayan


A 'Nycticebus kayan' é totalmente nova para a ciência

2012-12-14

N. kayan
A equipa de cientistas que está a estudar oNycticebus (de primata da família Lorisidae) nas selvas de Bornéu encontrou uma espécie até agora desconhecida. A análise das suas marcas faciais e do pelo está já publicada no«American Journal of Primatology». Duas outras espécies, consideradas, antes, subespécies do Nycticebus, foram também reconhecidas como espécies distintas.
Os avanços tecnológicos têm melhorado o nosso conhecimento acerca da diversidade dos mamíferos nocturnos”, diz Rachel Munds, da Universidade de Missouri Columbia. Historicamente, muitas espécies não eram reconhecidas pois confundiam-se com outras, sendo catalogadas erroneamente.

Nos últimos 25 anos, o número de espécies de primatas duplicou; no entanto, as espécies nocturnas continuaram escondidas da ciência. O Nycticebus (também conhecido como lóris lento) é um género de primata próximo do lémur. Encontra-se no sudeste asiático e tem uma característica rara entre os primatas: a sua mordidela é tóxica. Na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais o seu estado é tido como 'vulnerável' ou 'em perigo'.

Os lóris lentos podem ser reconhecidos pela coloração única do pelo do corpo e do focinho. Os padrões do pelo são muitas vezes utilizados para fazer a distinção entre espécies. As espécies nocturnas têm uma coloração mais enigmática e menos diferenças externas óbvias.
A equipa de investigação focou-se nas cores distintivas do lóris lento, cujo focinho tem a aparência de uma máscara, com os olhos cobertos por manchas e a cabeça com várias formas de chapéu. As diferenças entre essas marcas resultaram no reconhecimento de quatro espécies: a já conhecida N. menagensis, a N. bancanus e a N. borneanus (antes consideradas sub-espécies da primeira) e N. kayan, nova para a ciência.
O estudo sugere que haverá ainda mais diversidade para descobrir nas selvas do Bornéu e nas ilhas próximas. No entanto, muito deste território está ameaçado pela actividade humana, o que levanta muitas questões acerca da preservação destas espécies.
Fonte: Ciência hoje

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Quercus alerta para perigo de extinção da lampreia do Nabão


actualizado: Wed, 12 Dec 2012 14:26:14 GMT | de Lusa
A lampreia do Nabão, espécie recentemente identificada por investigadores das universidades de Évora e Lisboa, está em risco de extinção, alertou hoje o presidente do núcleo regional do Ribatejo e Estremadura da Quercus, Domingos Patacho.
PAULO NOVAIS/LUSA
PAULO NOVAIS/LUSA
“A classificação de ‘Criticamente em Perigo’ é a mesma que recai sobre o lince ibérico. Esta espécie encontra-se em áreas de distribuição muito restritas e fragmentadas, em Ourém, com constrangimentos ao nível da multiplicação, pelo que todo o cuidado das entidades públicas e de privados será sempre pouco”, disse Domingos Patacho à agência Lusa.
O uso abusivo de produtos agroquímicos, cujos nutrientes podem contaminar as linhas de água, limpezas das margens agressivas, ausência de saneamento em algumas áreas, bem como possíveis descargas de pequenas unidades industriais, são “ameaças reais às lampreias”, sublinhou o ambientalista.
Domingos Patacho frisou que, com uma população escassa na sub-bacia do Nabão, nas ribeiras de Caxarias, Seiça e Olival, e “agora que se reconheceu que esta lampreia é exclusiva do norte do concelho de Ourém”, a situação “traz responsabilidades acrescidas a todos os cidadãos do concelho e demais entidades para a sua conservação”.
Em comunicado, a Quercus “apela à necessidade de se conservarem as florestas ribeirinhas e os leitos dos cursos em toda a bacia hidrográfica, para que não subsistam ameaças que coloquem a espécie no limiar da extinção”.
Na semana passada, o Centro de Oceanografia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa anunciou a descoberta de três novas espécies: a lampreia da Costa de Prata (Lampreta alvariensis), a lampreia do Nabão (Lampreta auremensis) e a lampreia do Sado (Lampreta lusitanica).
A Quercus recorda que, em 1989, dois investigadores, Pedro Cortes e Carlos Almaça, realizaram um “Estudo Ecológico da Ribeira de Seiça” e chegaram a identificar a lampreia como uma nova espécie, mas essa confirmação surgiu apenas 23 anos depois.
JYMC // JLG.
Fonte: msn

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Afinal, há seis (e não três) espécies de lampreias em Portugal


Passam grande parte da vida enterradas no leito dos rios — na realidade, quatro a cinco anos, como larvas. Umas vão para o mar e são as comestíveis, outras mantêm-se sempre nos cursos de água doce.
A lampreia-do-sado (Lampetra lusitanica) é uma das novas espécies identificadas FILIPE LOPES

Tanto quanto se sabia, só viviam três espécies de lampreias em Portugal. De uma só assentada, uma equipa de biólogos portugueses anuncia agora a descoberta de outras três espécies, que vivem em áreas muito limitadas de alguns rios. Assim, à lampreia-marinha, à lampreia-de-rio e à lampreia-de-riacho juntam-se agora a lampreia-da-costa-da-prata, a lampreia-do-nabão e a lampreia-do-sado, nomes que remetem para os seus locais de origem.
A lampreia-marinha (Petromyzon marinus) é aquela que é um autêntico pitéu e que leva muita gente em romarias gastronómicas. Já a lampreia-de-rio (Lampetra fluviatilis) e a lampreia-de-riacho (Lampetra planeri) não se comem e são mais raras do que a sua congénere marinha, pelo que estão classificadas como “criticamente em perigo” de extinção, na última versão doLivro Vermelho dos Vertebrados de Portugal, de 2005.
Tanto a lampreia-de-riacho como a lampreia-de-rio encontram-se distribuídas pela Europa, onde são abundantes — mas, na Península Ibérica, a sua situação muda de figura e concentram-se quase só em Portugal. A lampreia-de-riacho está presente sobretudo em Portugal, desde o Douro até ao Sado, pois em Espanha limita-se a dois núcleos populacionais muito circunscritos no Norte do país. Já a lampreia-de-rio foi declarada extinta em Espanha e, em Portugal, encontra-se somente no troço inferior dos rios Tejo e Sorraia. Para cada uma destas espécies, a população não ultrapassará os dez mil indivíduos.
Agora, o trabalho desenvolvido na tese de doutoramento deCatarina Mateus — orientada por Pedro Raposo de Almeida, do Centro de Oceanografia da Faculdade de Ciências de Lisboa e da Universidade de Évora, e Judite Alves, do Museu Nacional de História Natural e da Ciência, em Lisboa — permitiu a identificação das três novas espécies. Serão descritas num artigo já aceite para publicação na revista alemã Contributions to Zoology, assinado ainda pelo biólogo Bernardo Quintella, também da Faculdade de Ciências de Lisboa.
Este resultado é o culminar de dez anos de trabalho, que remonta ao início da revisão do Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal, realça Pedro Raposo de Almeida. “Nessa revisão, fizemos um levantamento em todo o país da distribuição das espécies e encontrámos uma série de pequenas populações que não estavam descritas.”
Essas populações ficaram então incluídas como lampreias-de-riacho no livro que avalia o estatuto de conservação dos vertebrados portugueses: “Percebemos que havia pequenas diferenças, sobretudo genéticas, num grupo de lampreias-de-riacho. Mas, até se confirmar que são espécies diferentes, há um trabalho muito grande pela frente”, explica Pedro Raposo de Almeida.
Ainda que as diferenças sejam principalmente genéticas, elas também têm menos dentes.
As três novas espécies são endémicas de Portugal, o que significa que vivem apenas aqui. A lampreia-da-costa-da-prata (Lampetra alavariensis) é endémica das bacias hidrográficas do Vouga e do Esmoriz, enquanto a lampreia-do-sado (Lampetra lusitanica) existe só nesta rede hidrográfica e a lampreia-do-nabão (Lampetra auremensis) se restringe a esta bacia afluente do Tejo.
Para a equipa, não há grandes dúvidas de que as três novas espécies devem ser consideradas como “criticamente em perigo” de extinção, até porque a espécie de onde foram agora retiradas já tem esse estatuto de conservação. “Além de serem espécies endémicas e as áreas de distribuição serem muito restritas, as populações são muito pequenas e sofrem muitas pressões antropogénicas. As linhas de água, sobretudo do Sado, têm muitas pressões em termos agrícolas.”
Ao todo, as três novas espécies terão 10 mil a 20 mil indivíduos, embora só com um levantamento populacional se possa fazer uma estimativa mais rigorosa.
Caminhos diferentes após a metamorfose
Uma das fases em que as lampreias estão muito vulneráveis é aquela em que ficam enterradas nas zonas arenosas do leito dos rios, como larvas — na verdade, passam quatro a cinco anos nisso, filtrando a água para se alimentarem de pequenos organismos em suspensão. Na fase larvar, se for feita uma regularização do leito do rio, se houver extracção de areias ou for construída uma barragem na zona onde elas estão enterradas, uma parte da população é eliminada. “Não lhes pode faltar a água”, diz ainda Pedro Raposo de Almeida.
Decorridos aqueles anos todos entre os sedimentos, elas sofrem uma metamorfose, em que, por exemplo, desenvolvem uma boca circular em forma de ventosa. E então as espécies seguem caminhos distintos.
A lampreia-marinha, que pode ter um metro de comprimento, faz uma migração para o mar, onde fica durante um a dois anos, parasitando outros peixes, até que regressa ao rio para desovar e morrer. A lampreia-de-rio também migra, mas pouco: “A nossa percepção é que tem uma migração muito restrita: achamos que nem sai do estuário do Tejo. Também é parasita.”
Já a lampreia-de-riacho e as suas primas agora identificadas, que podem ter cerca de 15 centímetros, não se alimentam depois da metamorfose. Na fase adulta, de alguns meses apenas, limitam-se a reproduzirem-se e, depois disso, morrem.
fonte: Público.pt

domingo, 2 de dezembro de 2012

A guerra dos peixes



Ruivaco do oeste adulto nascido no Aquário Vasco da GamaRuivaco do oeste adulto nascido no Aquário Vasco da Gama
Fotografia © DREm geral, os peixes só são notícia quando aparecem mortos aos milhares devido a uma qualquer descarga ilegal de poluentes. Ouve-se então falar de carpas, pimpões, achigãs, barbos e bogas. Curiosamente, alguns destes nomes referem-se a espécies originárias dos quatro cantos do mundo, que foram invadindo (literalmente) os nossos ecossistemas dulçaquícolas. O biólogo Jorge Nunes propõe uma viagem aos rios, lagos e albufeiras de Portugal, em busca dos peixes de água doce. Dos “nossos” e dos “estrangeiros” que, entretanto, se tornaram residentes.
Embora as cidades e vilas portuguesas se localizem, quase todas, à beira-rio, permitindo um convívio diário com idílicos cenários ribeirinhos, a maior parte das pessoas desconhece os seus vizinhos fluviais, que habitam paredes-meias com as suas casas e jardins. Os reflexos do azul do céu, do verde da folhagem e do colorido dos panoramas nos espelhos de água são tão cativantes que frequentemente nos esquecemos que por baixo deles também se nasce, vive e morre como em qualquer outro lugar. Nesse desconhecido mundo subaquático, onde tudo se passa longe dos indiscretos olhares humanos, a luta pela sobrevivência é uma constante. Nunca se sabe quando é que de um buraco ou detrás de uma pedra surge repentinamente uma boca esfomeada, quantas vezes “estrangeira”, “exótica” ou “alienígena”.
Não interessa se começamos esta jornada nos píncaros agrestes da serra do Gerês, fartos em água, ou na árida paisagem alentejana, onde muitos dos ribeiros e lagoas desaparecem sazonalmente com o calor do estio. Por norma, onde houver água existem, quase sempre, peixes. Muitos deles são autóctones, ou seja, sempre viveram nos rios portugueses; outros, ditos “exóticos”, têm vindo a ser introduzidos e a conquistar terreno, que é como quem diz água, encontrando-se atualmente disseminados em quase todos os habitats de água doce nacionais. Vinte e cinco a trinta por cento do número de espécies piscícolas fluviais que vivem nas águas doces de Portugal continental são exóticas, com origem nos quatro cantos do mundo (seis espécies norte-americanas, sete euro-asiáticas e uma sul-americana), e foram todas introduzidas pela mão do homem.
À boleia da malária
Ao que parece, a introdução de peixes alienígenas visou, sobretudo, aumentar a diversidade piscícola e o rendimento das águas interiores, aproveitando primordialmente o enorme valor de algumas espécies, como o achigã e a truta-arco-íris. Além de constituírem novos ingredientes gastronómicos, passaram a ser muito procurados pelos amantes da pesca recreativa (lúdica e desportiva). Assim, a chegada destes imigrantes aquáticos a terras lusas parece ter tido essencialmente várias origens: por via acidental, como terá acontecido com a tenca e a carpa (que fugiram de culturas monásticas), com o góbio (que se escapuliu de pisciculturas) ou com o chanchito (utilizado em aquariofilia); por via oficial, em que peixes como o achigã, a truta-arco-íris e a carpa foram introduzidos sob responsabilidade das instâncias que têm tido a seu cargo a gestão dos recursos aquícolas; por via informal, em que espécies como o achigã, a gambúsia, o lúcio e o peixe-gato-negro, introduzidos intencional ou acidentalmente na vizinha Espanha (onde já se contam 25 espécies exóticas, 15 das quais introduzidas depois de 1949), se expandiram pelos rios ibéricos até águas portuguesas; e por via ilegal, através de alguns pescadores desportivos que continuam a introduzir e a dispersar espécies ao arrepio da legislação.
O flagelo da malária (doença infecciosa, também conhecida por “paludismo”, causada por protozoários transmitidos pela picada de mosquitos do género Anopheles), que assolou Portugal e Espanha até meados do século XX, justificou a introdução de espécies como o chanchito e a gambúsia. Estes peixes são famosos pelo seu apetite voraz por larvas de mosquitos e havia esperança de que pudessem ser uma arma eficaz na luta antipalúdica.
O chanchito (Cichlasoma facetum),[foto] também conhecido por “espanhol”, “castanhola” ou “castanheta”, é oriundo dos rios costeiros do Brasil e do Uruguai. Surgiu em águas lusas na década de 1940 (segundo a Carta Piscícola Nacional, terá sido introduzido no rio Vouga, na Praia de Mira, em 1943), encontrando-se atual­mente nas bacias dos rios do sul (Guadiana, Mira e Sado), onde prefere os charcos e locais com águas tranquilas. Distingue-se facilmente devido à coloração amarelo-metálico a esverdeado com bandas escuras transversais. A barbatana dorsal é bastante comprida, alcançando dois terços do comprimento total (que pode chegar aos 17 centímetros), e a barbatana caudal é redonda e ostenta uma mancha escura na base. É uma espécie insetívora. A sua territorialidade, sobretudo na época de reprodução, e a alimentação carnívora fazem pressupor que seja uma ameaça para espécies autóctones, apesar da sua dispersão e de a expansão ser muito pequena
Quanto à gambúsia (Gambusia holbrooki), foi importada da Carolina do Norte em 1921 e foi introduzida na Europa a partir de Espanha, tendo alcançado Portugal através do seu principal rio ibérico: o Tejo (foi detetada no Sorraia, afluente do Tejo, em 1931). É uma espécie de reduzidas dimensões, que faz lembrar um guppie (os peixinhos ornamentais tão apreciados em aquariofilia). Tem um aspeto inconfundível, com o corpo acentuadamente mais estreito para trás da barbatana anal (onde se localiza o órgão copulador dos machos), a abertura bocal colocada em posição dorsal com a maxila inferior proeminente e a barbatana caudal homocerca. Vive em troços de águas lentas e temperadas, com abundante vegetação e abaixo dos mil metros, e suporta águas muito contaminadas, elevadas temperaturas e baixos valores de oxigénio.
Alimenta-se de pequenos animais aquáticos, insetos e aracnídeos. Devido aos seus hábitos alimentares e ao facto de poderem atingir densidades elevadas, de mais de 11.000 indivíduos por hectare, “tem um efeito negativo sobre espécies nativas que ocupam o mesmo habitat”, segundo a Carta Piscícola Nacional (CPN). Na Península Ibérica, ocorre em praticamente todas as bacias, e em território nacional já conquistou inúmeros rios, ribeiros e regatos. Após se ter constatado que, afinal, o efeito controlador sobre os mosquitos transmissores da malária parecia ser reduzido, ainda se tentou a sua erradicação, mas todas as tentativas resultaram infrutíferas. Em pouco tempo, assistiu-se à imparável expansão dos pequenos gambuzinos (curioso nome vulgar pelo qual também são conhecidos), por tudo o que era curso de água. Também neste caso, como acontece com os homens, se aplica o ditado popular: “Os peixes não se medem aos palmos”. Como derradeira tentativa para limitar a expansão das suas populações, optou-se pela introdução de outro peixe: o achigã. Assim, fixou-se na Península Ibérica mais um “estrangeiro”, oriundo da América do Norte.
Imigrantes americanos
O achigã (Micropterus salmoides) foi inicialmente introduzido nos Açores (em 1898), e só bastante mais tarde no continente (em 1952), com a finalidade de dinamizar a pesca desportiva e limitar as populações de gambúsia. No entanto, tal como as restantes espécies piscícolas exóticas, deu-se muito bem por cá e atual­mente é um dos peixes que despertam maior interesse, quer dos pescadores, quer dos apreciadores de ementas de peixe (apresenta um elevado interesse gastronómico, atingindo cinco a oito euros por quilo), encontrando-se por todo o país, sobretudo na bacia hidrográfica do Tejo e a sul desta (está presente em praticamente todas as albufeiras do sul, muitas do centro e algumas do norte). É um peixe de tamanho médio, que atinge habitualmente meio metro de comprimento. Possui o corpo alto, de coloração verde azeitona com bandas escuras mais ou menos evidentes nos flancos, a boca de grandes dimensões protráctil com dentes nas mandíbulas (o maxilar ultrapassa o bordo posterior do olho), e a barbatana dorsal dividida em duas. É um predador que se alimenta predominantemente de outros peixes e de lagostins-de-água-doce, larvas de insetos aquáticos (como ninfas de libélula), insetos adultos, aracnídeos, anfíbios e, ocasionalmente, micromamíferos e répteis. A CPN declara que “esta espécie levou à redução das populações autóctones de ciprinídeos”.
A perca-sol (Lepomis gibbosus) faz jus ao nome: é um dos peixes mais belos entre os que foram introduzidos em águas continentais portuguesas. Ostenta uma cor muito vistosa, com bandas azuladas que irradiam da cabeça até aos flancos, ventre amarelo e uma mancha negra e vermelha na parte posterior do opérculo. Trata-se de um peixe que não ultrapassa os 15 centímetros, com barbatana dorsal dividida em duas partes, uma primeira de raios ossificados e uma segunda com raios ramificados. Trata-se de um habitante das zonas lênticas (águas calmas), com escassa profundidade e densa vegetação. Suporta bem a falta de oxigénio e as altas temperaturas. Trazida da América do Norte, terá chegado à Europa no último quartel do século XIX para aquariofilia, embora só tenha sido referida em Portugal (no Tejo, no Sado e no Guadiana) nos anos 1970. Na atualidade, está presente na totalidade das bacias hidrográficas. Por detrás da sua atraente beleza, esconde-se, porém, uma terrível predadora de insetos e de ovos e alevins de outras espécies aquáticas. É considerada uma praga e uma das principais responsáveis pelo desaparecimento dos peixes nativos.
O peixe-gato-negro (Amieurus melas) é uma espécie originária da América do Norte que foi introduzida em Espanha no início do século XX, tendo chegado a Portugal através da bacia do Tejo (atualmente, já se encontra no Sado e no Guadiana). Trata-se de um peixe de tamanho médio, que não vai além de meio metro de comprimento. Tem uma coloração preta e a zona ventral amarelada. Possui quatro pares de barbilhos, sendo um dos pares mais comprido do que as barbatanas peitorais. O corpo está geralmente coberto com muco. É extremamente tolerante à poluição, subsistindo em águas com baixos níveis de oxigénio dissolvido e elevadas temperaturas.
Quanto às trutas, encontram-se representadas por duas espécies: a truta-de-rio (Salmo trutta), indígena da Europa, e a truta-arco-íris (Oncorhynchus mykiss), originária da América do Norte. Enquanto a primeira vive em águas correntes, bem oxigenadas, límpidas e frescas, e é muito sensível à poluição e à elevada temperatura, a segunda prefere as albufeiras e os cursos de água calmos, tolerando temperaturas até 25ºC (a sua distribuição é muito localizada, figurando em albufeiras do Cávado, do Douro, do Mondego e do Tejo). Trata-se de uma espécie de tamanho médio (pode chegar ao meio metro), com a cabeça mais pequena do que a sua congénere autóctone. Apresenta duas barbatanas dorsais (a primeira espinhosa e a segunda adiposa), e a barbatana caudal pode estar completamente coberta de manchas negras. Possui, geralmente, uma lista de cor púrpura no flanco, onde surgem igualmente manchas negras que não são rodeadas por um círculo colorido (sendo esta uma boa característica para distinguir ambas as espécies). A espécie exótica consome larvas de invertebrados e peixes de pequeno tamanho. É presença habitual em aquacultura, devido ao seu elevado interesse gastronómico.
Residentes euro-asiáticos
Curiosamente, por causa das trutas, mais precisamente das truticulturas espanholas, foi introduzido o góbio (Gobio lozanoi), uma espécie euro-asiática usada como alimento vivo. Assim se espalhou pelos rios Douro e Tejo, onde é atualmente muito comum. Trata-se de um peixe que não ultrapassa os quinze centímetros. Tem o corpo alongado, a cabeça pequena e larga, a boca ínfera, um par de barbilhos que atingem o bordo posterior do olho, o dorso escuro e os flancos com seis a onze manchas redondas e azuladas alinhadas longitudinalmente. A barbatana caudal está bem fendida (com lóbulos pontiagudos) e as ventrais estão posicionadas atrás da inserção da dorsal.
As carpas (Cyprinus carpio) e as tencas (Tinca tinca), espécies euro-asiáticas, ambas muito apreciadas como alimento e de fácil reprodução em cativeiro, terão chegado a Portugal pelas mãos de monges que as consumiam em dias santos, nos quais se impunha a abstinência de carne. A ser verdade que a sua chegada poderá ter tido “mão divina”, foi apenas uma questão de tempo e de oportunidade até que alguns exemplares se escapassem das granjas agrícolas dos mosteiros, onde eram cuidadosamente mantidas, para colonizarem os rios.
As carpas, que habitam sobretudo as albufeiras e os cursos de água com corrente fraca e vegetação abundante (com exceção das localizadas a norte da bacia do Douro), talvez tenham chegado mais cedo, pois foram domesticadas pelos romanos e poderão ter sido introduzidas por eles. São peixes de tamanho médio a grande (podem atingir 80 cm), de cor variável (geralmente, verde-acastanhada), com os flancos em tons dourados que escurecem em direção ao dorso. A boca apresenta dois pares de barbilhos sensoriais, sendo terminal e protráctil, o que se adequa à sua atividade essencialmente bentónica. Trata-se de uma espécie resistente à escassez de oxigénio e à poluição, que destrói a vegetação submersa, aumentando a turbidez dos rios.
Quanto à tenca, ainda subsistem dúvidas se é natural ou se foi introduzida em Portugal. A CPN inclina-se para esta segunda hipótese, assegurando que foi introduzida, no século XII, pelos monges de Cister, nas granjas agrícolas próximas do rio Alcoa (Alcobaça). É um peixe de fundo que habita preferencialmente em albufeiras e em locais de fraca corrente (uma vez que suporta baixos níveis de oxigénio dissolvido na água) e de vegetação abundante. O corpo alongado, com pedúnculo caudal curto e alto, pode chegar aos 80 cm de comprimento. Possui um único par de barbilhos nos lábios e apresenta coloração esverdeada, que pode variar consoante o meio onde habita.
O alburno ou ablete (Alburnus alburnus) é uma espécie originária do centro e do leste da Europa. Foi introduzido em Espanha, na década de 1990, para pesca desportiva, e acabou por chegar a Portugal através dos cursos de água internacionais. No entanto, a primeira referência nacional refere-se à barragem do Caia, onde terá sido introduzido por pescadores desportivos para servir de alimento a outros peixes, como o achigã. Encontra-se na atualidade nas bacias hidrográficas do Tejo, do Sado, do Mira e do Guadiana. Possui hábitos gregários e exibe grande plasticidade, ocorrendo em sistemas lóticos e lênticos, apesar de selecionar preferencialmente as zonas de menor profundidade. Apresenta um regime alimentar carnívoro, consumindo sobretudo insetos aquáticos, crustáceos e zooplâncton.
O lúcio (Esox lucius), com uma distribuição circumpolar (essencialmente norte-americana e euro-asiática), foi introduzido em 1951 no rio Tejo (em território espanhol) passando posteriormente para Portugal (na década de 60 já estava presente no Guadiana). É um carnívoro territorial e solitário, que pode atingir grandes dimensões (mais de um metro de comprimento) e apresenta um corpo alongado, com focinho comprido e achatado. A boca é grande, a barbatana dorsal é oposta à anal e muito posterior e ostenta coloração verde ou esverdeada com manchas amarelas. Trata-se de um predador que começa por comer invertebrados enquanto jovem, acabando, em adulto, a alimentar-se de peixes (gambúsias, bogas, achigã, escalos, barbos e carpas), lagostins-de-água-doce e anfíbios. Ocorre nas bacias hidrográficas do Cávado, do Douro, do Tejo e do Guadiana. Escolhe preferencialmente troços lóticos de corrente fraca e vasta vegetação, onde se dissimula para emboscar as presas.
O lucioperca (Sander luciperca) é outra espécie oriunda do centro e do leste da Europa, introduzida ilegalmente em Espanha, no decurso da década de 1970. Presentemente, encontra-se em franca expansão no nosso ­país, estando presente nas bacias hidrográficas do Cávado, do Ave, do Douro, do Tejo e do Guadiana. Pode chegar aos 80 cm. Apresenta duas barbatanas dorsais espinhosas, cabeça grande, boca com dentes proeminentes e fortes e maxilar largo. O dorso é esverdeado, com oito a doze bandas escuras transversais. Os adultos alimentam-se exclusivamente de peixes, sobretudo escalos. Por ser uma espécie altamente especializada no consumo de peixes, tornou-se uma grande ameaça para a fauna autóctone, lê-se na CPN.
O peixe-gato-europeu (Silurus glanis) é, sem sombra de dúvida, a espécie dulçaquícola europeia de maior envergadura, podendo atingir os dois metros e meio de comprimento e mais de cem quilos de peso. A pesca desportiva motivou a sua introdução em Espanha, na década de 1970. Por cá, está referenciado para o rio Tejo e andou nas bocas do mundo no verão passado, quando um exemplar com um metro e meio, avistado na albufeira de Castelo do Bode (rio Zêzere), foi confundido com um crocodilo. Trata-se de uma espécie carnívora muito voraz, que se alimenta de peixes, anfíbios, lagostins-do-rio e aves aquáticas.
A lista dos peixes introduzidos não ficaria completa sem referir o pimpão ou peixe-dourado (Carassius auratus), um parente próximo das famosas variedades de peixes-vermelhos que apreciamos em pequenos aquários ou nos lagos dos jardins. Parece ter sido um dos primeiros a chegar a Portugal, por volta do século XVII, trazido da China, e daqui terá partido para vários países europeus. Em estado selvagem, o pimpão perde a sua cor vermelha e apresenta-se com uma tonalidade castanha-esverdeada. Vive em todos os rios portugueses e hibrida com a carpa (machos de pimpão com fêmeas de carpa), originando uma forma intermédia com apenas um par de barbilhos.
Convivência difícil
O aumento da diversidade piscícola que resulta das espécies introduzidas pode parecer, à primeira vista, uma mais-valia. Porém, ao contrário de uma sã convivência, tem-se assistido a um domínio preocupante dos novos inquilinos dos rios portugueses.
Os peixes exóticos têm tido um aumento acentuado nas últimas décadas, sendo também de assinalar que algumas das suas áreas de distribuição têm vindo a ser significativamente ampliadas. Ambientaram-se tão bem aos nossos rios que alguns, como a carpa e a perca-sol, são na atualidade as espécies dominantes em alguns lugares, nomeadamente, em albufeiras do sul, como as do Vale do Gaio, do Pego do Altar, de Maranhão e de Montargil.
Já não há dúvidas de que as 14 espécies introduzidas nas águas doces continentais vieram para ficar. Embora algumas delas não revelem indícios de causarem desequilíbrios significativos nos ecossistemas, como é o caso do chanchito, outras, nomeadamente as que apresentam caráter invasor, como a perca-sol e a gambúsia, poderão ser extraor­di­nariamente prejudiciais para a fauna e a flora dulçaquícolas autóctones: “A introdução de espécies não indígenas na natureza pode originar situações de predação ou competição com espécies nativas, a transmissão de agentes patogénicos ou de parasitas e afetar seriamente a diversidade biológica, as atividades económicas ou a saúde pública, com prejuízos irreversíveis e de difícil contabilização”, avisa o Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território.
Espécies autóctones migradoras
Alguns peixes autóctones, ditos “migradores”, não se contentam com a extensão dos nossos rios e têm horizontes mais largos, estendendo as suas viagens até ao mar. Uns deslocam-se do meio marinho para o meio fluvial, a fim de se reproduzirem (espécies anádromas), e após o nascimento, os juvenis iniciam a viagem em sentido contrário. Outros, porém, nascidos no mar (como as enguias), regressam aos rios para amadurecer (espécies catádromas). São animais muito especiais, visto que tanto conseguem viver em água doce como salgada.
De entre os viajantes de longo curso, temos o sável (Alosa alosa), referenciado nos rios Minho, Lima, Douro, Mondego, Zêzere, Sado e Guadiana; a savelha (Alosa fallax), muito comum em Portugal, sendo frequente nos rios Minho, Lima, Douro, Mondego, Sado e Guadiana; a lampreia (Petromyzon marinus), que vive no mar e pode atingir 1,20 m de comprimento, é um peixe parasitário que sobe os rios até ao seu curso superior, onde desova; e a enguia (Anguilla anguilla), o verdadeiro ex-libris dos peixes migradores, uma vez que inicia o seu ciclo de vida no mar dos Sargaços (localizado no Oceano Atlântico, a mais de 4000 quilómetros da Europa), onde se reproduz, e completa-o nas águas doces europeias, às quais as suas larvas chegam após um a dois anos de travessia oceânica.
Com o estatuto de migradores surgem ainda a solha-das-pedras (Platichthys flesus), um peixe achatado que reside nos estuários e se desloca às águas costeiras para realizar a postura; a truta-marisca (Salmo trutta), que inicia a subida dos rios no verão, preferindo águas frias e bem oxigenadas para a desova (no estado adulto, pode atingir 1,40 m e pesar 50 kg); o salmão (Salmo salar), que se reproduz entre Junho e Novembro, em locais bem oxigenados e em zonas a montante (nos rios em que nasceram); e o esturjão (Acipenser sturio), que passa a maior parte da vida no mar, vindo reproduzir-se nos troços principais dos rios Douro e Guadiana; a carne desta espécie é muito apreciada e as suas ovas (caviar) constituem um requinte gastronómico de elevado preço. Característica comum a todos os peixes migradores é o seu excelente sabor, o que rapidamente os catapultou para o top das ementas de peixes e para cabeças de cartaz de inúmeras feiras gastronómicas, competindo com os peixes marinhos de melhor qualidade.
As espécies migradoras, no entanto, têm vindo a diminuir nos nossos rios, tornando-se cada vez mais raras. Para além da sobrepesca, muitas vezes desregrada e à margem da lei, há outras causas: obstáculos à migração (como barragens, represas e açudes), que as impedem de atingir os locais mais propícios à sua reprodução; alterações do habitat, principalmente devido à extração de inertes; e poluição e destruição das zonas de desova. Impedidas de se reproduzirem e sujeitas a captura desenfreada, facilmente se percebe que algumas destas espécies sejam consideradas ameaçadas, de acordo como Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal: salmão (criticamente em perigo) e lampreia e savelha (vulneráveis). Segundo esta obra, reeditada em 2008, “os peixes dulciaquícolas e migradores correspondem ao grupo taxonómico com a percentagem mais elevada de espécies classificadas com categorias de ameaça ou quase ameaçadas (69% das 441 avaliadas).”
Não tem havido a precaução sistemática de dotar os obstáculos, como barragens, represas e açudes, de passagens para peixes. E, muitas vezes, quando tal preocupação existiu, as passagens construídas mostram-se quase sempre inadequadas. No Douro, o efeito de barreira é bem conhecido, pois os peixes só conseguem chegar à parte terminal do rio, onde surge a primeira de várias barragens que amansaram as suas águas revoltosas e impediram para sempre a subida destes migradores. Curiosamente, nas albufeiras de Castelo de Bode (Zêzere) e Carrapatelo (Douro), existem populações de sável que ficaram retidas pela construção das respetivas barragens. Porém, estas populações constituem uma exceção, dado que os indivíduos que as compõem conseguem nascer, crescer e reproduzir-se exclusivamente em águas doces.

Preciosidades a preservar
As joias da coroa dos nossos rios e albufeiras são os peixes considerados endemismos portugueses (boga-portuguesa, boga, ruivaco, ruivaco-do-oeste, escalo-do-Arade e escalo-do-Mira) ou ibéricos (saramugo, barbo-do-norte, barbo-focinheiro, barbo-de-cabeça-pequena, barbo-do-sul, barbo-de-Steindachner, boga-de-boca-arqueada, boga-do-Guadiana, bordalo, panjorca, escalo-do-norte, escalo-do-sul, verdemã e verdemã-do-norte). São todos catalogados como espécies ameaçadas.
A boga-portuguesa (Chondrostoma lusitanicum) foi dada a conhecer ao mundo científico em 1980 por Maria João Collares-Pereira, investigadora da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Segundo fonte do Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade (ICNB), trata-se de uma espécie pouco abundante (criticamente em perigo), que se encontra em regressão devido à alteração e destruição do habitat, ao aniquilamento e perturbação das populações, à introdução de novas espécies e ao isolamento geográfico. A sua distribuição geográfica parece cingir-se a alguns troços terminais das bacias hidrográficas do Tejo para sul. Mais recentemente (2005), foi descoberta a boga Chondrostoma almacai, que habita nos rios Mira, Arade e Bensafrim e se considera também criticamente em perigo.
O ruivaco (Chondrostoma oligolepis), que também só pode ser observado em Portugal, embora pareça abundante e com populações estáveis, segundo dados do ICNB, pode ser ameaçado pela destruição do habitat e pela introdução de espécies exóticas nos cursos inferiores das bacias dos rios Douro, Vouga, Mondego e Tejo, onde ocorre. Os autores que descreveram a espécie em 2005 propõem que lhe seja atribuído o estatuto de conservação de “criticamente ameaçado”.
O escalo-do-Arade (Squalius aradensis), descoberto em 1998, restringe a sua distribuição às ribeiras de Seixe e de Quarteira, ocorrendo em Aljezur, Alvor e Arade (que lhe deu o nome). Está criticamente em perigo e o aumento das pressões humanas devido aos interesses turísticos, o agravamento dos períodos de seca, os vários tipos de poluição e a introdução de espécies exóticas são alguns dos principais fatores de ameaça. Já o escalo-do-Mira (Squalius torgalensis), tal como indicia o seu nome comum, ocupa a bacia hidrográfica do Mira, onde está criticamente em perigo. Pressões climáticas durante a época estival associadas às pressões humanas devido aos interesses turísticos, à extração de inertes que destrói as zonas de postura e a vários tipos de poluição são algumas das causas para a sua regressão.
Dos peixes endémicos da Península Ibérica, que existem apenas em Portugal e Espanha, merece destaque o saramugo, que, com os seus 7 cm de comprimento, é o mais pequeno dos peixes da família dos Ciprinídeos (na qual se incluem os barbos, as bogas, os escalos, a carpa e o pimpão, entre outros) e um dos mais ameaçados de extinção do mundo, estando a sua área de distribuição confinada a alguns fragmentos da bacia do Guadiana.
De entre as cinco espécies de barbos indígenas da Península Ibérica, quatro são consideradas raras. Estas últimas ocorrem todas na bacia do Guadiana, embora o barbo-focinheiro também possa ser encontrado no Tejo e o barbo-do-sul no Mira e em algumas bacias do Algarve. Quanto ao barbo-do-norte, não se encontra ameaçado e é muito comum, ocorrendo em todas as bacias hidrográficas, à exceção das do Mira e do Guadiana e das ribeiras algarvias. Também as quatro espécies de bogas são todas exclusivas da Ibéria, três das quais consideradas raras (boga-portuguesa, boga-de-boca-arqueada e boga-do-Guadiana). Quer a boga-de-boca-arqueada, quer a boga-do-Guadiana vivem principalmente naquele grande rio do sul, onde são pouco abundantes e parecem estar em regressão.
Ameaças e conservação
Todos os peixes de água doce, em especial as espécies consideradas ameaçadas, estão sujeitos a inúmeros fatores que põe em causa a sua sobrevivência: poluição resultante de descargas de efluentes não tratados de origem industrial, urbana e pecuária, assim como a provocada pela utilização de pesticidas e fertilizantes na agricultura; sobreexploração dos recursos hídricos, nomeadamente através da captação de água para rega ou de transvases que provocam a diminuição dos caudais, reduzindo drasticamente o habitat disponível; regularização dos sistemas hídricos através da transformação dos cursos de água em valas artificiais; extração de materiais inertes, com mudança da morfologia do leito do rio e destruição da vegetação que serve de refúgio, alimentação e desova; destruição da vegetação ribeirinha, através de ações de limpeza das margens que diminuem as sombras dos cursos fluviais e alteram a temperatura e a oxigenação da água e o regime dos caudais; introdução de espécies não autóctones de maior interesse comercial ou desportivo (lúcio, achigã e perca-sol, entre outras); efeito de barreira, provocado por barragens e açudes que dificultam eventuais migrações, convertem as águas correntes em águas paradas (alterando as ­suas características físico-químicas), fragmentam as populações e alteram o regime de caudais a jusante da construção; retenção de sedimentos a montante, agravando a erosão das margens e alterando o leito do rio a jusante.
Urge definir normas orientadoras do ordenamento e gestão dos recursos aquícolas, decidir e apoiar medidas mitigadoras dos impactos ecológicos de obras fluviais e promover, realizar e colaborar na execução de estudos de caráter técnico-científico. O futuro dos nossos peixes de água doce passa, em grande medida, por essas ações.
J.N.
Super 164 – Dezembro 2011