domingo, 25 de agosto de 2013

A desflorestação da floresta do Bornéu e a distribuição dos orangotangos

Em cima, a evolução da desflorestação do Bornéu desde 1950, com projeção para 2020.
Em baixo, a distribuição do orangotango desde 1930 até os nossos dias

Uma casa a mirrar
A maior fatia de desflorestação que se tem verificado no Bornéu, e que se prevê para a próxima década, coincide em larga medida com a área de distribuição do orangotango, não deixando margem para os animais se alimentarem convenientemente ou se deslocarem livremente nos seus territórios sem, além disso, serem alvo de caçadores, agricultores e madeireiros.
O aumento dramático do número de orfãos recolhidos nos santuários e centros de recuperação de vida selvagem locais tem conduzido à sua sobrelotação. Apesar da proclamação do presidente indonésio, em 2007, de concordância com os objetivos do Indonesia Orangutan Conservation Action Plan 2007- 2017 (nomeadamente, a libertação na Natureza de todos os orangotangos existentes nos centros de reabilitação, até 2015), o certo é que estes animais apenas devem ser libertados após anos de cuidados humanos e de adaptação vigiada à sua nova vida em meio selvagem, e nunca antes dos cinco anos de idade. Têm sido realizadas iniciativas de reintrodução de orangotangos em áreas protegidas, mas, apesar dos esforços das agências de conservação e do interesse político destas iniciativas, a realidade é que o destino dos animais é mais do que incerto, tendo em conta que os seus fatores de ameaça não estão a ser contrariados de forma minimamente encorajadora.

Super interessante nº169 – Maio de 2012

sábado, 24 de agosto de 2013

Orangotangos do Bornéu

A última escolha
São os maiores mamíferos arbóreos do planeta. Conhecidos como “homens da floresta” (do indonésio e malaio orang, “pessoa”, e hutan, “floresta”), os orangotangos foram incluídos na mesma família taxonómica da espécie humana (Hominidae) e são os últimos grandes símios hominóides presentes na Ásia. Têm também uma “profissão”: são agricultores. Os frutos constituem mais de 60 por cento da sua diversificada dieta, formada por mais 500 espécies de plantas diferentes (das quais consomem também flores, folhas, rebentos e casca) e ainda alguns insectos. Nas suas deslocações diárias, a uma altura de 6 a 10 metros na copa das árvores, estes primatas de pelagem ruiva, ar bonacheirão e reconhecida inteligência dispersam o pólen e as sementes destas plantas pelos seus territórios individuais, que cobrem centenas a milhares de hectares de floresta, contribuinso assim para o equilibrio da flora e da fauna do seu ecossistema, um dos mais ricos em biodiversidade do mundo. (!)
No entanto, a gigantesca conversão das suas florestas nativas em plantações, especialmente o óleo de palma (Elaeis guineensis), que se verificou nas recentes décadas, resultou no desaparecimento e fragmentação de grande parte do seu habitat. Trouxe ainda outras formas de pressão humana, como a caça para consumo da sua carne, a venda das crias no comércio de animais de estimação (ilegal, mas intenso e continuado) e o abate generalizado por serem considerados uma ameaça às culturas agrícolas.
De acordo com as estimativas mais recentes, 2004, a população de orangotango de Samatra (Pongo abelii) ainda existente conta apenas com perto de 7300 indivíduos presentes numa área total de floresta de 20552 quilómetros quadrados, da qual menos de metade se situa abaixo dos mil metros de altitude e consegue albergar populações permanentes. O orangotango do Bornéu (Pongo pygmaeus), por sua vez, tem a população total estimada em 45 a 69 mil indivíduos, ou seja, o equivalente ao número de habitantes das cidades de Évora e Aveiro, numa área total de habitat adequado, mas altamente fragmentado, próxima de Portugal continental.
Além de serem o único território nativo dos orangotangos, a Indonésia e a Malásia são também os maiores produtores de óleo de palma do mundo. Não é por acaso que investem na gordura vegetal desta palmeira africana, também conhecida como dendezeiro ou dendém. Cerca de metade dos produtos embalados que encontramos hoje nos supermercados, desde géneros alimentares á cosmética, comtém óleo de palma. Considerado também um percursor interessante para o biodiesel (embora menos “verde” do que parece), a sua importância não se esgota no nível macroeconómico: as famílias e os pequenos produtores locais reconhecem no óleo de palma a possibilidade da melhoria da sua qualidade de vida e a opção de escolaridade para os seus filhos, criando uma enorme pressão sobre as florestas naturais.
Foi precisamente para defender a produção sustentável de óleo de palma e os valiosos ecossistemas  que têm desaparecido a um ritmo assustador, na região, que a World Wildlife Found (WWF) ajudou a criar, em 2004, a Round-table on Sustainable Palm Oil (RSPO). Esta organização de visão mundial e empenho local junta produtores, processadores, vendedores, retalhistas, investidores e entidades bancárias, ONGs ambientais e de desenvolvimento, entidades governamentais e consumidores de bens manufaturados, com o objectivo de promover boas práticas de produção de óleo de palma e sua certificação.
Em 2008, a RSPO apenas podia contar com 17 fábricas certificadas em dois países, a Malásia e a Papuásia-Nova Guiné, mas reúne agora 29 empresas produtoras e 135 fábricas de seis nacionalidades: Brasil, Colômbia, Ilhas Salomão, Indonésia, Malásia e a Papuásia-Nova Guiné. A entrada destes novos parceiros traduziu-se num aumento de volume certificado de vendas de óleo de palma de 350 mil toneladas, em 2009, para 2,5 milhões de toneladas, em 2011. A MacDonald´s aderiu também a esta organização, em 2011, tal como já haviam feito outras grandes empresas como a Walmart e a Citigroup. Boas notícias, tendo em conta o volume deste óleo que é consumido anualmente na fritura de batatas e McNuggets nas múltiplas sucursais MacDonald´s das regiões da Ásia-Pacífico, do Médio Oriente, de África e da América Latina.
Para outras organizações de conservação, como a Greenpeace, estas notícias não são, no entanto, ainda dignas de júbilo. É óbvio que a adesão bem intencionada à RSPO não será suficiente para mudar a tendência atual, e nem sequer garante o cumprimento das boas práticas. Se as taxas de desflorestação na região se mantiverem inalteradas (ou aumentarem), os orangotangos estarão extintos dentro de duas a três décadas e, com eles, um elevado número de outras espécies biológicas, muitas delas ainda nem conhecidas pela ciência. A preocupação dos céticos não é sequer somente paisagística ou moral: a substituição das florestas tropicais húmidas por plantações, que se tem verificado em todo o mundo, nas últimas décadas, poderá fazer pesar a balança das alterações climáticas para um nível indesejável e irreversível. Por outrtas palavras, teremos de aprender a sobreviver num mundo de fenómenos climatéricos intensos e imprevisíveis dos quais já ouvimos falar, mas que ainda não acreditamos que possa materializar-se.
Para muitos analistas, a escolha principal sobre a tendência futura da região e dos seus recursos naturais é decididamente dos consumidores. O óleo de palma é mundialmente consumido de forma quotidiana e descontraída, para o que tem contribuido o facto de estar frequentemente dissimulado nas listas de ingredientes sob a designação de “óleo vegetal” ou “gordura vegetal”. No final de 2011, a União Europeia adotou regulamentação que obriga à identificação exata dos óleos de origem vegetal nos produtos alimentares, com a intenção de promover mudanças significativas na indústria do óleo de palma, bem como a proteção dos consumidores, de modo a poderem fazer escolhas informadas.
Infelizmente, o homem da floresta não pode escolher. O leitor pode. Qual é a sua escolha?

Super interessante nº169 – Maio de 2012

terça-feira, 20 de agosto de 2013

No trilho dos naturalistas em São Tomé

19/08/2013 - 16:15
O botânico Jorge Paiva e uma equipa de filmagem da produtora Terratreme estiveram em São Tomé e Príncipe a seguir os trilhos de dois naturalistas da Universidade de Coimbra que lá estiveram em 1885 e 1903. O documentário agora está a ser montado - esta é apenas uma amostra - no âmbito de um projecto sobre antigas expedições botânicas portuguesas em África.
http://www.publico.pt/multimedia/video/naturalistas-20130816-165941
Realização: Luisa Homem | Tiago Hespanha Direcção Fotografia: Pedro Pinho Som: Tiago HespanhaMontagem: Francisco Moreira Direcção Produção: Marta Lança Assistente de Produção: Rui DuarteProdução: Terratreme Coordenação de Produção: Susana Nobre Coordenação Científica: António GouveiaParticipação Especial: Jorge Paiva Voz-Off: David Pereira Bastos

Fonte: ecosfera - público.pt

domingo, 18 de agosto de 2013

Nova descoberta agrícola pode acabar com os fertilizantes

Por  em 1.08.2013 as 15:00
k-bigpic
A humanidade tem utilizado fertilizantes nitrogenados para sustentar o crescimento das plantações desde a época neolítica. Mas a produção de alimentos em quantidade suficiente para alimentar mais de sete bilhões de bocas exige aplicações pesadas de fertilizantes, e o seu uso excessivo está cobrando um preço muito caro da natureza: danos ambientais nos valores de 91 bilhões a 428 bilhões apenas no continente europeu.
Até agora, as emissões de amônia e óxido de nitrogênio por parte das indústrias de fertilizantes e os enormes impactos ambientais nas zonas marinhas próximas a fazendas causados pelo escoamento de nitrogênio eram considerados males necessários em nome da agricultura. Afinal, injetar fertilizantes no solo era a única maneira de fazer com que as plantas fixassem o nitrogênio necessário. Porém, um pesquisador da Universidade de Nottingham, Inglaterra, acabou de descobrir como forçar cada planta da Terra a retirar o nitrogênio diretamente da atmosfera, sem necessidade de fertilizantes.
O nitrogênio é essencial para plantas e animais. Mas, infelizmente, poucas plantas são capazes de absorvê-lo diretamente do ar. Elas precisam esperar que bactérias no solo o convertam em amônia ou amônio, em um processo conhecido como fixação de nitrogênio. Em seguida, as raízes da planta absorvem essas substâncias e as convertem em nitrato.
As poucas plantas que conseguem captar o nitrogênio atmosférico, especificamente legumes como ervilhas e feijões, o fazem com a ajuda de cianobactérias simbióticas que realizam a fixação do nitrogênio de dentro da própria planta. E é essa relação mutuamente benéfica que o professor Edward Cocking, diretor da Centro de Fixação do Nitrogênio da Universidade de Nottingham, desenvolveu todas as plantações do mundo.
A técnica, conhecida como “N-Fix”, não envolve a modificação do genoma da planta, e sim uma cepa específica de bactérias fixadoras de nitrogênio comumente encontradas na cana-de-açúcar. Essas bactérias podem também colonizar as células de outras espécies vegetais. A maioria das bactérias simbióticas evoluíram para viver apenas em plantas específicas, mas a cepa estudada por Cocking e sua equipe possui a capacidade de se estabelecer em praticamente qualquer lugar, incluindo todas as principais culturas alimentares da humanidade. O N-Fix é aplicado como um revestimento de sementes, quando então as bactérias penetram cada célula da planta em crescimento e lhes dão a capacidades de fixar o nitrogênio.
A universidade tem realizado testes e estudos de segurança sobre esse assunto durante mais de uma década. Recentemente, a empresa Azotic Technologies Ltd está utilizando a tecnologia em experimentos de campo para a aprovação regulatória no Reino Unido, Europa, EUA, Canadá e Brasil. Não há nenhuma palavra ainda sobre quanto tempo isso vai levar, mas, uma vez que este método vingue, vai transformar o nosso mundo. [Gizmondo]
Vídeo em http://www.youtube.com/watch?v=HzHhDpCJhjU
Fonte: hypescience

Olinguito é o novo carnívoro agora descoberto

Nº 32
agosto 2013
16-08-2013 19:00
© Mark Gurney
Cientistas do Smithsonian Institute descobrem nova espécie de carnívoro e a primeira em 35 anos no Continente americano. Recebeu o nome de olinguito e o nome científico de Bassaricyon neblina.









Tem apenas 900 gramas, uma aparência que parece resultar do cruzamento entre um gato doméstico e um urso, é ativo principalmente à noite, come sobretudo fruta, raramente desce das árvores e têm apenas uma cria de cada vez.

O olinguito é nativo das florestas da Colômbia e do Equador, mas esconde uma história curiosa, já que apesar de só agora ter sido descrito e identificado pela ciência, com a publicação da descoberta na edição de 15 de Agosto da revista científica ZooKeys, sabe-se que este pequeno animal já foi observado na natureza, esteve em jardins zoológicos e museus e que a sua identidade foi confundida durante 100 anos com a dos olingos.

Olinguito recebe nome científico </i>Bassaricyon neblina</i>
Olinguito recebe nome científico Bassaricyon neblina
© I. Poglayen-Neuwall
Kristofer Helgen, investigador que liderou a equipa de cientistas que publicou agora a descoberta diz, citado em comunicado doSmithsonian Institute que, «a descoberta do olinguito mostra-nos que o mundo ainda não está completamente explorado e que os seus segredos mais básicos não foram ainda revelados».

O investigador adianta que «se novos carnívoros podem ser descobertos, que outras surpresas nos esperam? Muitas das espécies no mundo ainda não são conhecidas da ciência. Documentá-las é o primeiro passo para compreender a completa riqueza e diversidade da vida na Terra».

Para a descoberta desta nova espécie foram precisos dez anos, sendo que o resultado foi surpreendente, já que os cientistas estavam envolvidos num estudo sobre olingos com o objetivo de saber quantas espécies de olingos eram conhecidas e como é que estas estavam distribuídas.

Para isso levaram a cabo uma vasta investigação que envolveu a deslocação a museus em todo o mundo, testes de ADN e revisão de informação histórica. Foi então que os cientistas descobriram um esqueleto e dentes de um animal que eram mais pequenos e apresentavam formas diferentes das dos olingos.

Olinguito nativo das florestas da Colômbia e do Equador
Olinguito nativo das florestas da Colômbia e do Equador
© Mark Gurney
«Exames a peles em museus revelaram que esta nova espécie era também no geral mais pequena e que possuía uma longa e densa capa», indica a instituição em comunicado e adianta que «registos no campo mostraram que a espécie ocorria numa única área das Montanhas de Andes entre 1500 metros e os 2700 metros acima do nível do mar – altitudes muito mais elevadas do que as conhecidas para o olingo.

Para Kristofer Helgen esta descoberta «é o primeiro passo» que «prova que a espécie existe e dar-lhe um nome é onde tudo começa».

O cientista diz ainda que «este é um belo animal, mas sabemos tão pouco sobre ele. Em quantos países vive? O que mais podemos aprender sobre o seu comportamento? O que precisamos de fazer para assegurar a sua conservação?».
Fonte: tvciência

UA estuda técnica inédita contra a erosão depois dos incêndios florestais

Matérias-primas para triturar a pensar no ‘acolchoamento’ não faltam em Portugal

2013-07-31
O investigador Sérgio Alegre e o mulch
O investigador Sérgio Alegre e o mulch
Reduzir drasticamente o nível de erosão dos solos florestais depois da ocorrência de um incêndio é o grande objetivo do mulching, uma técnica que pela primeira vez está a ser estudada em Portugal pela mão de uma equipa de investigação da Universidade de Aveiro (UA). Tendo em conta que após um incêndio a erosão por ação da água das chuvas pode levar a perdas de cerca de 50 toneladas de solo, a técnica em estudo pela UA pode reduzir a escorrência de águas nos terrenos ardidos em mais 40 por cento e, com isso, diminuir a erosão do solo em 90 por cento. 
O método inovador que a UA quer introduzir em Portugal, e que em tradução livre se pode designar por ‘acolchoado’, consiste na distribuição pelos solos consumidos pelo fogo de uma camada de restos florestais triturados.

“Com a vegetação e a manta morta da superfície dos terrenos transformados em cinzas o solo fica extremamente vulnerável à ação da erosão”, aponta Sérgio Alegre. O investigador do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar (CESAM) da UA, e responsável pelos primeiros estudos em Portugal da utilização do mulching, relata que há terrenos que chegam a perder várias dezenas de toneladas de solo por hectare durante o primeiro ano depois de um incêndio.


Com a vegetação e a manta morta da superfície dos terrenos transformados em cinzas o solo fica extremamente vulnerável à ação da erosão
Com a vegetação e a manta morta da superfície dos terrenos transformados em cinzas o solo fica extremamente vulnerável à ação da erosão
“As implicações negativas que este cenário acarreta vão desde a perda de fertilidade e productividade dos solos até à destruição dos ecosistemas e bens a juzante das áreas afectadas como é o caso de caminhos, pontes, praias fluviais ou propriedades”, diz o investigador.

O problema da erosão adensa-se, por exemplo, quando esta afeta o normal funcionamento de barragens e centrais hidroelétricas. “Com a acumulação das toneladas de sedimentos levados pela chuva até aos rios, e destes até às albufeiras das barragens, estas podem perder o volume útil para armazenar a água, o que leva à necessidade do seu desassoreamento e limpeza para poder acumular mais água”, explica Sérgio Alegre.

Ainda que em Portugal o desaparecimento do solo por erosão após incêndio não esteja muito bem estudado, Sérgio Alegre aponta para investigações realizadas em “países que têm uma longa tradição nesses estudos”, nomeadamente nos EUA, onde as perdas podem atingir até 65 toneladas por hectare ardido durante o primeiro ano após o incêndio. Aqui bem perto, na Galiza, já se quantificaram perdas de 10 a 35 toneladas por hectare durante um ano.

“No caso de Portugal, só agora começamos a ter algumas estimativas, mas são medições pontuais em pequenas parcelas de erosão, pelo que é precisso continuar a investigar para conhecer os efeitos dos incêndios a escalas maiores”, refere.

Máterias-primas à mão de semear

Depois de um incêndio é preciso avaliar as zonas onde há risco de erosão
Depois de um incêndio é preciso avaliar as zonas onde há risco de erosão
Níveis de pluviosidade, inclinação dos terrenos, características geológicas, clima, tipos de vegetação e ciclo de incêndios a que o terreno tem estado sujeito são alguns dos fatores ligados ao processo de erosão e que influenciam as perdas de solo.“Depois de um incêndio é preciso avaliar as zonas onde há risco de erosão. É claro que não podemos tratar toda a superfície ardida com o mulching porque seria inútil aplicá-lo nalgumas áreas que não precisam”, aponta Sérgio Alegre.

É o caso das áreas sem declive ou áreas ardidas com uma baixa intensidade do fogo onde as árvores ainda possuem folhas nas copas que, depois de caírem, fornecem de uma proteção natural ao solo. No caso dos pinhais, “a caruma funciona como um mulching natural tão efetivo como os restos florestais triturados”.

Matérias-primas para triturar a pensar no ‘acolchoamento’ não faltam em Portugal. “Pode-se aplicar as toneladas e toneladas de cascas de madeira que não são utilizadas pelas fábricas de pasta de papel. É um material muito bom pois tem fibras longas que se adaptam ao solo formando uma espécie de rede que retém água e sedimentos”, explica o investigador do CESAM.

O mulching pode igualmente fazer uso do que sobra das podas e de “restos derivados das limpezas dos matos, dos jardins ou das bermas das estradas que, na maioria dos casos, são enviados para lixeiras”.

Técnicas actuais ineficazes

Aplicado à mão ou com recurso a meios aéreos sobre os terrenos mais expostos a fenómenos de erosão, o mulching pretende substituir as “ineficazes” mas muito usadas barreiras de madeira cravadas nos solos ardidos para reterem águas e sedimentos. Sérgio Alegre aponta que “ em comparação com o mulch, essas barreiras, não cumprem a função de reter as águas e de mitigar a perca de sedimentos dos terrenos expostos à erosão”.

O mulching pode igualmente fazer uso de restos derivados das limpezas dos matos
O mulching pode igualmente fazer uso de restos derivados das limpezas dos matos
Pelo contrário, o investigador do CESAM, garante que o mulch, numa primeira fase, reduz as perdas de solo e, posteriormente, através da própria decomposição dos restos florestais, acaba por se incorporar no ecossistema florestal. “Como é um material que pode reter água por absorção ou por retenção nas micro-barreiras que as fibras formam, este método reduz a quantidade de água que flui para os rios até 40 ou 50 por cento”, explica Sérgio Alegre.

O processo, que “dá o mesmo trabalho que a colocação das barreiras”, pode evitar despesas maiores. O investigador não tem dúvidas: “Se com esta técnica se evitar que a perda do solo, um recurso não renovável à escala humana, leve à alteração dos ecossistemas aquáticos a jusante da área ardida, ou que, por exemplo, uma barragem fique cheia, então os gastos estão mais do que justificados”.
Fonte: Ciênciahoje.pt

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Manhas de polvo

São inteligentes e criativos
Terem três e sangue azul não é a sua característica mais extravagante. Estes moluscos fascinam a ciência pela sua grande inteligência, o comportamento complexo, os dotes que revelam no momento da conquista e o dom para se orientarem.
Sem arroz – A imagem mostra um polvo gigante, Enteroctopus dolfleini. Vive no Oceano Pacífico e alcança os nove metros de comprimento.
Bípedes quando precisam
Em 2008, 24 centros oceanográficos europeus iniciaram um estudo para descobrir se os polvos eram octodestros e se serviam dos oito tentáculos com a mesma destreza, ou se, pelo contrário, recorriam a um em particular. O que observaram foi que eles utilizam duas das extremidades para se deslocarem sobre o leito marinho e as outras seis para explorarem e investigarem os objectos ao seu alcance, incluindo peças de lego e cubos de Rubik que os biólogos lhes ofereciam nas suas experiências. Confirmou-se, assim, o que já tinha sido observado, em 2005, na Indonésia, por biólogos da Universidade da Califórnia: quando um polvo precisa de fugir, levanta seis braços e utiliza os outros dois para correr a toda a velocidade pelo fundo do mar.
Sexo com amor e abraços
Durante décadas, os cientistas viram os octopódes como seres solitários e nada românticos na sua vida sexual. Todavia, um estudo recente da Universidade da Califórnia revela que os machos não acasalam com a primeira fêmea que se atravessa no caminho. De facto, costumam rondar durante vários dias a candidata eleita, adornam-se com padrões vistosos na pele, mantêm os rivais á distância e abraçam mesmo, carinhosamente, algum braço da companheira depois de a terem conseguido conquistar.
Esperto que nem um alho
A fim de medir a inteligência dos polvos, os zoólogos recorrem a testes nos quais avaliam, sobretudo, dois parâmetros: a capacidade de aprendizagem e a memória. Deste modo, descobriram que eles se entendem a distinguir formas geométricas (quadrados, retângulos, circulos…), abrir boiões com tampas de enroscar ou atravessar complicados labirintos. Além disso, os cefalópodes aprendem ao observar os seus semelhantes, um comportamento que se considerava exclusivo do ser humano e de alguns mamíferos. Como demonstrou uma experiência o neurobiólogo Benny Hochner, possuem um circuito de memória a curto prazo e outro a longo prazo. Não é por acaso que os polvos possuem meio milhão de neurónios organizados numa complexa rede de lóbulos, semelhantes á estrutura do cérebro humano.
Um lado venenoso
Há três anos, a revista Jornal of Molecular Evolution fez eco de um estudo da Universidade de Melbourne (Austrália) que demonstrava que todas as espécies de polvo (e de chocos e de lulas) têm alguma substância tóxica no organismo para se defenderem dos predadores ou atacarem as presas. Ao analisar os genes que produzem as diferentes peçonhas que esgrimem, os biólogos concluíram que a origem do arsenal remonta a um antepassado venenoso comum aos polvos, aos chocos e às lulas.
Imitadores natos
Quando há um predador nas proximidades, o polvo-mímico (Thaumoctopus mimicos), da Indonésia, pode mascarar-se de raia venenosa, serpente marinha, peixe-leão cheio de espinhos ou mesmo alforreca. Todods os papéis de mau assentam bem a este octópode. Já no Atlântico, destaca-se como o ator o polvo Macrotriopus defilippi, de tentáculos compridos, que se oculta dos inimigos copiando a forma e os movimentos da solha, um peixe chato semelhante ao linguado.
Muita personalidade
A psicóloga Jennifer Mather e o biólogo Roland Anderson iniciaram, em 1993, um trabalho pioneiro com mais de 40 polvos vermelhos, para averiguar se os seus comportamentos podiam ser individualizados. Depois de os exporem a situações distintas em semanas diferentes, concluiram que se podia enquadrar, nitidamente, o seu comportamento em três tipos de personalidade, aplicados, até então, apenas a seres humanos: agressivos, tímidos e passivos. Os resultados foram publicados no Journal of Comparative Psychology.
Passar despercebidos
A epiderme dos polvos contem células com pigmentos, os cromatóforos, que lhe permitem mudar de cor e de padrão decorativo (pele lisa, com riscas, manchas…) com extrema facilidade. Assim, podem camuflar-se e passar despercebidos tanto entre recifes de corais vermelhos como sobre a areia cinzenta. As mudanças de tonalidade também lhes servem para exprimir a sua disposição.
Arsenal defensivo próprio
Em 2009, o polvo Amphioctopus marginatus, da Indonésia, juntou-se á lista de animais capazes de usar ferramentas. Tal como mostrou uma investigação publicada na revista Current Biology, os exemplares desta espécie recolhem as cascas de coco que caem no fundo do mar e armazenam-nas num local escondido, para serem usadas como escudo defensivo. Veja-os neste vídeo: http://www.youtube.com/watch?v=QRfOGOntnbw
GPS incorporado
Embora estes animais passem horas a caçar e percorram centenas de metros nas suas explorações, costumam regressar todos os dias á toca para descansar e nunca se esquecem do caminho de regresso. O segredo para não se perderem no fundo do mar? Ao estudar o polvo vulgar (Octopus vulgaris), nas Bermudas, a psicóloga Jennifer Mather, da Universidade de Lethbridge (Canadá), chegou á conclusão de que eles não deixam um rasto químico á sua passagem, como as formigas, mas visualizam as rochas proeminentes, plantas, corais e outros aspetos que encontram ao longo da rota, para traçarem um mapa mental que conservam no cérebro durante semanas. A sua memória espacial é extraordinária.

Super interessante nº168 – Abril de 2012