sábado, 18 de fevereiro de 2012

Nova espécie de planta homenageia cientista português


Dendroceros paivae ‘ganha’ apelido de Jorge Paiva
2012-02-13
Por Susana Lage
Jorge Paiva
Uma nova espécie de planta descoberta no arquipélago de São Tomé e Príncipe recebeu um nome científico que presta homenagem ao professor Jorge Paiva:  (Dendroceros) paivae.

“É uma honra lembrarem-se do meu nome e como trabalhei também com a flora de São Tomé a notícia deixou-me muito agradado”, diz o botânico aoCiência Hoje (CH).
Não é a primeira vez que o investigador da Universidade de Coimbra recebe uma espécie em sua homenagem por investigadores portugueses e estrangeiros. “Há mais plantas que me dedicaram, encontradas em Portugal, Timor e Angola”, conta. “Que me lembre é a quinta espécie mas é sempre uma surpresa quando recebo a notícia”, acrescenta.

César Garcia é o responsável pela descoberta da nova espécie e pela etimologia do nome atribuído, seguindo as regras da nomenclatura botânica, em latim.

Ao
 CH, o investigador do Jardim Botânico do Museu Nacional de História Natural e da Ciência, da Universidade de Lisboa, explica que a razão de atribuir este nome à nova espécie prendeu-se com o trabalho que Jorge Paiva tem desenvolvido no conhecimento da biodiversidade à escala mundial. “Pelo seu trabalho na preservação da natureza, na sua personalidade forte na luta contra os disparates ambientais promovido por pessoas que necessitavam mais anos de escola, pelo seu trabalho junto dos professores e alunos dos diferentes graus de ensino”, enumera.
Dendroceros paivae
Segundo o botânico, pretendeu-se também homenagear a Universidade de Coimbra, a Sociedade Broteriana fundada pelo Professor Júlio Henriques, “que inteligentemente contratou colectores no final do século XIX para enriquecer as colecções de Coimbra, prática que é hoje elaborada pelas melhores instituições mundiais”.

Planta monitoriza clima

Dendroceros paivae é uma espécie que pertence a um género muito pouco conhecido em África: antóceros (plantas semelhantes a musgos).“Existem poucas referências ao género nesse continente e são maioritariamente colheitas muito antigas”, garante César Garcia.

A descoberta foi feita durante uma expedição científica à ilha de São Tomé no ano de 2008, mas o reconhecimento da espécie como sendo nova para a ciência só foi possível após o estudo dos exemplares recolhidos e a comparação com exemplares de herbários de toda a Europa.

De acordo com César Garcia, ter encontrado esta planta é importante porque é o resultado de uma especiação, de factores ambientais específicos e de particularidades ecológicas.
 “Este grupo de plantas apresenta uma elevada especificidade ecológica, muitas espécies ao mínimo distúrbio desaparecem por isso são utilizados à escala mundial na monitorização das alterações climáticas, da qualidade dos habitats, da água (espécies aquáticas) e do ar (espécies epífitas)”.

Para César Garcia é essencial existir um conhecimento profundo das espécies.
 “São anos de treino e ter boas colecções bem preservadas num herbário é fundamental”, diz o investigador. “As colecções biológicas, mais que espécies guardadas são registos históricos de biodiversidade. Friedrich Welwitsch (1806-1872) colheu na região de Lisboa uma determinada espécie frutificada que só acontece quando a qualidade do ar é excelente. Essas espécies estão guardadas em herbário e são registos importantes da qualidade do ar ao longo dos séculos”, exemplifica.
César Garcia é responsável pela descoberta da nova espécie de planta
Algumas das espécies de São Tomé e Príncipe estão também a ser “alvo de análise de compostos químicos resultantes do metabolismo secundário”. Depois de identificados os compostos, a investigação passa por testar a sua bioactividade, isto é, quais são os compostos que são importantes para travar um vírus, para travar uma bactéria ou diferentes tipos de cancro.

Floresta autóctone preservada

Neste momento, César Garcia encontra-se a trabalhar na flora briológica de São Tomé e Príncipe, na flora briológica portuguesa, no livro vermelho das espécies de Briófitos Portugueses e no projecto «Um Bosque Perto de Si» da Ciência Viva e com coordenação científica do Museu Nacional de História Natural e da Ciência e do Centro de Biologia Ambiental.

“Cada vez são menos os que se dedicam a determinar espécies e a preservá-las, as revistas em que publicam cada vez têm menor impacto”, afirma o botânico. Portugal “necessita de mais pessoas que estejam num nível de fazer floras. O impacto de uma revista é o resultado das citações entre investigadores, se cada vez há menos pessoas na área, cada vez se tem menos citações e a área acaba, é um triste ciclo vicioso”, explica.

O investigador do Jardim Botânico considera que Portugal deveria ter uma
 “floresta autóctone preservada”, com “matas de produção com uma área bem menor e vigadas diariamente”, um país onde “as práticas ancestrais prevalecessem e onde não existissem grandes assimetrias entre o litoral e o interior”, onde é frequente observar-se terrenos abandonados, pontes pedonais sobre rios em ruína e aldeias sem pessoas.“Será que Portugal vai aguentar o ordenamento do território existente com os aumentos de temperatura esperados num futuro bem próximo?”
, questiona com preocupação.
Sobre Jorge Paiva
Nasceu em Cambondo, Angola, a 17 de Setembro de 1933. É licenciado em Ciências Biológicas pela Universidade de Coimbra e doutorado em Biologia pelo Departamento de Recursos Naturais e Meio Ambiente da Universidade de Vigo (Espanha). Foi investigador principal no Departamento de Botânica da Universidade de Coimbra, onde leccionou algumas disciplinas, e professor convidado na Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra. Como bolseiro do Instituto Nacional de Investigação Científica, trabalhou durante três anos em Londres nos Jardins de Kew e na Secção de História Natural do Museu Britânico. Pertenceu à Comissão Editorial e Redactorial da Flora Ibérica (Portugal e Espanha), da Flora de Cabo Verde e do Conspectus Florae Angolensis, assim como de algumas revistas científicas. Tem sido colaborador de algumas floras africanas. Colaborou com entidades apícolas e com os Serviços de Pneumologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. É membro activo de várias Associações e Comissões nacionais e estrangeiras em defesa do Meio Ambiente. Publicou mais de cinco centenas de trabalhos sobre fitotaxonomia, palinologia e ambiente. Actualmente, apesar de reformado do ensino, continua a trabalhar na flora tropical e na flora ibérica e também nas “lutas ambientalistas”.
 Fonte: Ciência hoje

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